24 de jan. de 2012

João 1:19

ESTUDO DO LIVRO DE JOÃO
Material divulgado pela União Missionária Brasileira

O autor do evangelho muda o estilo de sua escrita a partir do verso 19. Enquanto o “Prólogo” (1-18) se assemelha a um poema composto em estilo de alto teor poético (sendo possivelmente um hino cantado nas primeiras comunidades cristãs), a partir do verso 19, o autor do evangelho muda para um grego simples e claro.

Por um bom tempo acreditava-se que o Prólogo inicialmente não fazia parte do Evangelho e tivesse sido adaptado e acrescentado posteriormente por alguma hipotética “escola joanina”. Hoje se sabe que, tanto o “Prólogo” quanto o capítulo 21 (considerado um anexo), já faziam parte das mais antigas cópias das quais temos conhecimento.


Você, que junto conosco está lendo e meditando este Evangelho magnífico, poderia perguntar do porque a Umbet não copia simplesmente um dos milhares comentários do Evangelho de João. Vou procurar indicar-lhe algumas razões.

Um amigo teólogo nosso, com razão nos disse: “Esses comentários! ... Eles explicam o que está obvio e nada dizem a respeito de trechos onde surgem dúvidas”. É fácil encontrar quem pregue a Palavra usando os chavões conhecidos, decorados, que nada dizem aos leigos.

“Jesus morreu na cruz pelos seus pecados”, por exemplo. Embora seja essa uma grande verdade, será que alguém pode me traduzir isso numa linguagem que faça sentido para mim? Nos nossos estudos estamos tentando pensar junto com você. Não traremos tudo pré-mastigado. Ajudaremos você a descobrir a mensagem que o apóstolo apresenta.

Procuraremos ao máximo evitar “chavões”. As lições, como você deve ter percebido, te desafiam a pensar. Crer é pensar também! Nessa batalha pela “fé” (no bom sentido) encontramos dificuldades. Numa época em que assistimos ao deboche de tudo que é santo e reto, limpo e verdadeiro, como podemos confiar no que cremos?

O sermão do pastor nunca poderá salvá-lo, mas deve despertar seu desejo de ir correndo buscar a vida, da qual o pastor falou, na sua fonte. Essa fonte é Deus. O pastor pode indicar-lhe o caminho, apresentando a Palavra de Deus. Essa palavra virá a seu encontro. A compreensão da Palavra não será imparcial, senão sua resposta a uma chamada.

Você se lembra? “A luz brilha nas trevas e as trevas não prevaleceram contra ela”. Ninguém e nada pode impedir que você encontre essa vida do qual o apóstolo fala.
Vem de lado opostos os perigos que o estudioso da Palavra corre: Desde o século 19, teólogos renomados estão tentando provar que a vida e a mensagem de Jesus eram totalmente diferentes do que até então cremos.

Quem lê a Bíblia e a toma por “verdadeira”, é considerado fundamentalista atrasado. Você se lembra dos pastores holandeses do estudo 11, cuja fé em Deus morreu? Como será que eles conseguem atuar como “pastores” nas suas paróquias, se nem acreditam em Deus? C.S.Lewis, um dos maiores pensadores cristãos do século 20, nos contou como os sacerdotes anglicanos estavam, segundo eles mesmos, lidando com a questão.

Os pastores trabalham com dois tipos de “verdades”; uma expressa em “imagens”, usada para a pregação e que pode ser interpretada pelas ovelhas à vontade – a arte de ambigüidade moderna que deixa o crente ouvir o que ele quer – e a outra “verdade”, usada no intercâmbio entre os religiosos, livre de lendas e mitos, mas esotérico em sua essência. Segundo esses teólogos, não há e não houve milagres; esses seriam mitos ou imagens que deveriam ser devidamente interpretadas pela psicanálise.

Será que esse questionamento das verdades bíblicas “cola”? Veja de perto a questão do “milagre” ou da profecia. Se você, a priori, afirma que milagres ou profecias não existem, você de início exclui boa parte dos Evangelhos. Se há ou não há milagre ou sobrenatural, no entanto, é uma questão puramente filosófica, não científica.

A maior autoridade do mundo em questão de religião não fala nesta questão com maior autoridade que você! A premissa: “sobrenatural não existe” é trazida por eles de fora aos textos; não é conclusão do estudo dos mesmos. As conclusões de todas as autoridades dos críticos da Bíblia juntas não tem peso nenhum contra você; é resultado do espírito da época e os que assim falam, o fazem como pessoas influenciadas por ele.

Por isso, não se assuste quando aparecer a próxima manchete anunciando a morte de Deus ou quando se vir perante o próximo ataque à autoridade da Bíblia! O Espírito Santo de Deus que fala a você (quando você der ouvido ao evangelista), é o mesmo que falará ao maior teólogo do mundo; portanto ouça e tenha coragem! Deus vai falar com você!

Uma dica: a mensagem é transmitida no momento em que você consegue colocar aquilo que o apóstolo escreveu em termos que lhe são familiares. Foi isso que o apóstolo fez, quando ele, inspirado por Deus, procurou guardar em palavras humanas o mistério que testemunhou. Não decore somente! Pense naquilo que o apóstolo afirma, usando suas palavras. Procure termos adequados que fazem sentido para você. Assim, repentinamente, o autor começa a falar com você. Antes, você só decorava textos.

Somente entre os anos 1980 e 1984 foram lançados nada menos de 35 livros de líderes teólogos dedicados à “Pesquisa sobre o Jesus histórico”. Quem realmente era aquele homem que no Novo Testamento aparece como “Jesus de Nazaré?”. Será que viveu mesmo? A pergunta em si é lícita. A procura do “Jesus histórico” trouxe resultados inesperados.

Jesus viveu mesmo! Cada vez mais temos provas em mãos que trazem à luz fatos e informações daquele tempo e que até hoje eram desconhecidos, - circunstâncias culturais, por exemplo, que justificam determinadas ênfases nos relatórios dos Evangelistas. Sabemos hoje muito mais sobre costumes, religiosidade e a cultura do povo na época de Jesus do que há 50 anos atrás. Embora muito interessante, será que as descobertas nos ajudam em nossa procura do Jesus Vivo?

A história nunca poderá nos revelar o mistério de Jesus, do qual o Evangelista era testemunha. Ela nunca nos dará a resposta que queremos à pergunta: Quem era esse Jesus? Para responder a isso precisamos de palavras de testemunhas da época. A história pode-nos dar a moldura, nada mais. Ela até ajuda entender muitos “porquês” dos relatórios evangelísticos.

A imagem dentro da moldura continua sendo o Evangelho, naquele gênero de literatura distinta, como nos é apresentado. C.S.Lewis, professor de línguas medievais e antigas, considera impossível uma crítica ou uma leitura melhor da que os próprios Evangelistas fizeram daquilo que viam e viviam (Essays on Christianity, Collins, 1975). Segundo Lewis, não é dada ao homem compreensão além do momento presente, do “agora”. Nem essa realidade ele consegue captar satisfatoriamente, sem cair em contradições. Cuidado então com comentários científicos a respeito da pessoa e mensagem de Jesus!

Você crê na Bíblia? Crê mesmo? Ouça, nem Deus nem Jesus mandaram crer “na Bíblia”. Você deve crer (isto é: confiar incondicionalmente) em Jesus como o Cristo revelado na Bíblia. Quem confunde as duas coisas, com muita razão está sendo chamado de “Biblicista”. Nós temos a mensagem da Bíblia e, no nosso caso, do Novo Testamento, como regra de fé e vida. Ela é luz no caminho na medida em que nela reconhecemos “a Luz do mundo”. Nós não cremos “na Bíblia”; cremos, sim, em Jesus.

Os Evangelistas eram humanos. Tenha isso sempre em mente. Cada Evangelho foi escrito por uma pessoa humana, inspirado pelo Espírito de Deus, com um determinado desígnio. Cada Evangelista tinha uma determinada visão de Jesus e de acordo com essa visão ele compôs seu relato. É por essa razão que os quatro Evangelistas às vezes parecem não dizer a mesma coisa.

Marcos, que acabamos de estudar, enfatizou o completo abandono de Jesus em face da morte (“Deus meu, Deus meu, por que me desamparaste?”). Os intérpretes discordam em suas explicações de por que Marcos escolheu enfatizar isso. Lucas, por sua vez, ensina uma lição diferente. É possível que ele tenha querido dar um exemplo aos cristãos perseguidos sobre como eles devem encarar a morte, na plena certeza de que Deus está a seu lado em todos os seus tormentos (“hoje mesmo estarás comigo no paraíso” / Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito”).

Mateus enfatiza o discipulado no seu evangelho, e o comprometimento pessoal e voluntário (“venha após mim e farei de vocês pescadores de homens/ quem não deixar... não pode ser...”). Sobre o “porquê” dessas ênfases distintas os comentaristas discordam e há diversas maneiras de entendê-las.


O Evangelho de João é totalmente diferente de cada um dos três primeiros (sinópticos). O autor tem uma só preocupação: “estes... sinais foram registrados para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e, para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (20.31).

Tudo que serve a esse propósito, João relata. João vê Jesus na história de Deus com o mundo, não mais como o Messias dos judeus. João fala do Salvador do mundo. Meio século após os Evangelistas Mateus, Marcos e Lucas, ele já tem uma outra visão de seu Mestre.

Ele pressupõe que seus leitores conheçam os outros evangelhos (ou parte deles); não relata o que naqueles Evangelhos já foi contado, mas acrescenta. No Evangelho todo ele olha Jesus como a encarnação de Deus. Jesus é Divino. Tudo que poderia levar seu leitor a duvidar desse fato, João deixa de relatar. Ele não quer suscitar dúvidas. Assim, nunca ele vê seu Senhor fraco; Jesus sempre é Senhor da situação (“Está consumado!”).

Se queremos “provar” que o os Evangelhos como um todo são fiéis e sem erros, não o fazemos misturando todos os quatro de tal modo que Jesus acaba dizendo e fazendo tudo o que cada um dos escritores indica. Por exemplo, juntando as palavras de Jesus dos quatro Evangelhos numa determinada ocasião e alegando que Jesus falou tudo aquilo em seguida.

 Quem interpretar os Evangelhos desse modo está tolhendo a fala de cada autor; quem quer que faça isso não está lendo os Evangelhos – ele está inventando um novo Evangelho que nada mais tem a ver com aqueles que nos foram transmitidos. Infelizmente a maioria das pregações que ouvimos se baseia nessa unificação falsa, porque ela dispensa a ovelha de pensar por conta própria.

Sabe como devemos encarar as aparentes diferenças na apresentação de palavras e atos de Jesus? Deixando a miopia espiritual de lado, com a qual queremos empurrar todos os registros numa só caixa e anunciar aquilo (com medo de errar), como “fiel”.

Devemos, sim, saber e reconhecer que tudo aquilo e muito mais podia ser visto em Jesus; muito mais, e que os relatórios dos Evangelistas são frações, imagens às vezes; são aquilo que aquele ser humano na condição de discípulo e naquela hora era capaz de perceber. Havia muito mais! Esse “mais” entenderemos somente na eternidade futura (1.Cor.13.12).

“Há, porém, ainda muitas outras coisas que Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio eu que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos” (João 21.15).

João, com sua distância histórica maior, era capaz de ver o Cristo no seu verdadeiro contexto Divino, o que aos sinópticos, por estarem perto demais, ainda não fora possível.

Se você na leitura do Evangelho de João considerar os dois fatores: (a limitação humana: João só menciona aquilo que lhe serve para seu propósito (“...para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus...”) e
a visão ampla e profunda espiritual dada ao velho apóstolo, ultrapassando os demais, voando como seu símbolo, a águia), a visão que você terá de Jesus será outra.

Estamos orando para que seja dada a cada um de nós a ousadia espiritual e a humildade humana, ambas necessárias, para ouvir a mensagem de João.

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