Material divulgado pela União Missionária Brasileira
Há uma linda anedota que a tradição, bem documentada, nos transmite. Jerônimo a menciona e ela tem toda a probabilidade de ser autêntica. Lessing denominou-a de “Testamento de João”. João, quando velho e já fisicamente debilitado, continuava firmemente a participar dos cultos apoiado por dois homens, um de cada lado. No fim de cada “culto” (ainda não se conhecia a “missa” tal qual é hoje) ele costumava sussurrar aos presentes mais próximos: “Filhinhos, amem-se uns aos outros!” Com o decorrer do tempo e João sempre repetindo as mesmas palavras, os cristãos começavam a reclamar: “Mestre, o que é isso? Por que o senhor repete sempre a mesma coisa?” João emudeceu, pensou por um tempo e depois respondeu: “Assim foi que Deus ordenou e cumprir isso é o suficiente”. E imediatamente emendou: “Filhinhos, amem-se uns aos outros!”.
O termo “Filhinhos” aparece na primeira Carta do apóstolo e nada tem a ver com “criancice”.: “Filhinhos, guardai-vos dos ídolos! ... Filhinhos, já é a última hora...!” (caps. 5.21 e 2.18). Espiritualmente maduro, João compreendeu como futilidade todo ativismo religioso, qualificando-o de “presunção infantil” e comparando-o a criancinhas brincando na areia, que facilmente partem para briguinhas desnecessárias.
Enquanto ainda vivo, correu a fama de que João não morreria antes da volta do Senhor. No último capítulo do seu evangelho os autores do livro procuraram corrigir essa opinião, escrevendo: “Tornou-se corrente entre os irmãos o dito de que aquele discípulo não morreria. Ora, Jesus não dissera (a Pedro) que tal discípulo não morreria, mas: ‘Se eu quero que ele permaneça até que eu venha, que te importa?’ ” (21.21-22).
Diz a tradição que João, perto de seu centenário, sentiu a morte se aproximar. Ele se lembrou da palavra de Cristo: “Quem crê em mim, ainda que morra, viverá”(11.25). Mandou preparar sua sepultura, e quando pronta, desceu devagar os degraus para sua cripta. O famoso artista alemão Lucas Cranach, Pai (1472 – 1553) esculpiu essa serena cena em madeira. Assim que o ancião se deitou, expirou. Ainda hoje é mostrado o lugar de sua sepultura nas ruínas da “Igreja São João”, em Éfeso (Turquia).
Quem ler este santo evangelho, ainda perceberá o sopro do apóstolo. Aquele que olhar a placa simples do jazigo de João nas ruínas de Éfeso, se lembrará das palavras finais do seu evangelho: “Muitas outras coisas Jesus fez. Se todas elas fossem relatadas uma por uma, creio que nem no mundo inteiro caberiam os livros que seriam escritos” (21.25). Lembrar-se-á também das palavras de Jesus: “Tenho ainda muito que lhes dizer, mas vós não o podeis suportar agora; quando vier, porém, o Espírito da Verdade, ele vos guiará a toda verdade, porque não falará de si mesmo, mas dirá tudo que tiver ouvido e vos anunciará as coisas que hão de vir” (16.12,13).
Nunca chegaremos a esgotar a sabedoria desse evangelho; sempre continuaremos perante o “mistério joanino”. Assim como voa a águia, João voou alto, tão alto que, por pouco, não escapou da nossa vista. Com Santo Agostinho podemos afirmar: “É João que nos anuncia cousas sublimes, contemplando a luz íntima e eterna com seu firme olhar. É necessário as águias jovens serem provadas, agarradas pelas garras dos pais e sendo expostas à luz do sol. Aqueles entre eles que olharem firmemente para cima, serão reconhecidos como filhos. O que, porém, mesmo por um instante só, palpitar, será considerado estranho e as garras o soltarão para o abismo.” (Contra Celso, VI.6)
Grandiosas e ao mesmo tempo assustadoras são as palavras de Agostinho. Há séculos estamos sendo mantidos suspensos pela visão joanina. Mantenhamos a fé quando a mão Divina nos alcançar. Olhemos incessantemente na direção do sol que brilha através do evangelho joanino, a fim de sermos reconhecidos verdadeiros filhos do Cristo Eterno! (Nigg W. Os Evangelistas, vida e palavra).
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