24 de jun. de 2011

João 1:10-13

ESTUDO DO LIVRO DE JOÃO
Material divulgado pela União Missionária Brasileira

"(10) O Verbo estava no mundo, o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o conheceu. (11) Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. (12) Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus; a saber, aos que crêem no seu nome; (13) os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus".

(10) O Verbo estava no mundo, o mundo foi feito por intermédio dele, mas o mundo não o conheceu. A partir daqui, o Evangelista passa a falar do Verbo no tempo passado. O Verbo estava no mundo.
Para os helenistas, mundo (lit.cosmos) era “ordem universal”. João usa o termo “cosmos” para o “Tudo” que fora criado desde o Princípio, incluindo a humanidade.

O Verbo, pelo qual tudo veio a existir, estava presente nesse cosmos. João já está falando claramente de “alguém”, embora ainda não o tenha apresentado. Fala da inexplicável inimizade entre “Ele” e seu “cosmo”; não questiona nem especula sobre o “porque” dessa incompatibilidade. Simplesmente a criação não “conheceu” seu criador.

O termo “conheceu” é importante. João usa o termo de acordo com o pensamento judaico, bíblico ao contrário do pensamento grego de sua época e da cultura que ele conhecia e considerada no sentido científico, objetivo, racional sem envolver-se, portanto, no campo subjetivo, ético. Enquanto o grego pensa com a razão e a Gnose especula, a Bíblia “conhece” no nível ético-pessoal desde o Antigo Testamento.

Conhecer significa também “eleger” (confira Jeremias 9.3 ou Isaías 1.3) e sua negação seria “rejeitar”. Até a relação sexual entre marido e mulher é chamada “conhecer-se” (que em português é sinônimo de “unir-se”). O uso negativo do verbo “conhecer” aplicado à humanidade acentua o anti-natural do seu comportamento. Ela não O conheceu – ela O repudiou!

(11) Veio para o que era seu, e os seus não o receberam. Aqui a rejeição do “Logos histórico” chega ao seu último estágio. Quem eram “os seus” e o que é considerado “dEle”? Contrariando a terminologia da Gnose, João fala como judeu.

Com base no Salmo 24.1 que diz: “Ao Senhor pertence a terra e tudo o que nela se contém, o mundo e o que nele habitam”, poder-se-ia pensar na humanidade como um todo sendo “seu”. É mais provável, porém, que João, judeu e participante da relação especial de JHW (Deus) com Israel, seu povo, esteja aplicando a tragédia do Logos encarnado em Cristo ao seu próprio povo (Salmo 135.4: “Porque o Senhor escolheu a Jacó, a Israel como seu tesouro pessoal”). A eles, Deus havia confiado toda herança (confira Romanos 9.4-5).

No mais, todo cristianismo primitivo (no sentido de “inicial”) lia o Antigo Testamento à luz do Cristo encarnado. Existe uma tragédia maior do que não ser recebido pelos que são “seus”?

(12) Mas, a todos quantos o receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus;
João não especula sobre a sorte dos que têm rejeitado a Luz. Ele vê através do horizonte (uma afirmação africana para quem vê onde aparentemente não há nada). Nem todos têm rejeitado a Luz!
A expressão “a todos quantos” equivale a “qualquer um”, seja ele judeu ou não-judeu, culto ou ignorante, rico ou pobre.

“Receber Jesus”? Se tomamos a palavra “receber” no seu sentido literal, ela fica mais clara. Veja: não há visitantes que recebemos em nossa casa e outros que evitamos receber? “Receber Jesus” implica em um comprometimento pessoal. Se você recebe uma visita é porque a convidou. O mesmo se aplica no caso da Salvação. Hoje, o termo “aceitar Jesus” não tem peso, porque aprendemos a pensar de maneira diferente da do judeu. Aceitar alguém ainda não implica em relacionamento pessoal com ele. É simplesmente tolerá-lo. Por essa razão e porque João conhecia o pensamento helenista (do qual somos herdeiros) que João (e todo o Novo Testamento) nunca convidam a “aceitar” Jesus. Você deve “recebê-lO”!

“Mas a todos quantos O receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus";
João entende a salvação como “adoção”. O adotado recebe o direito de ser chamado pelo nome de seu novo pai. Não é assim no campo social? Somente honrado pelo “direito de ser chamado filho” alguém se torna filho legítimo de um Pai.

Para João não somos todos filhos de Deus; somos, sim, todos criados por Ele. “Somos todos filhos de Deus” é pensamento helenista, como a citação do “Fenômeno de Arato” (séc. 3 a.C.), usada por Paulo em Atos 17.28. Ninguém se torna “Filho de Deus” por herança (membro do povo eleito) como os Rabis ensinavam, nem por esforço ético ou código moral (religião) ou sabedoria oculta (Gnose= espiritualismo), muito menos por ritos sacramentais, como batismo e crisma. Somente sendo “agraciado” – “recebendo dEle o poder de ser feito filho” - nós nos tornamos Filhos de Deus.

Os judeus vangloriavam-se de seus direitos hereditários, e chamavam a si mesmos filhos de Abraão.
Agora os que “recebem a Ele” recebem um direito (o poder), o direito de se tornarem filhos (uma comparação tipicamente joanina) não apenas de Abraão, mas de Deus.

“... a saber, aos que crêem no seu nome” Ainda não aparece o nome Jesus, mas já se torna claro de quem o Prólogo fala. A “adoção”, ou “o poder para ser feito filho de Deus” corresponde ao “crer em seu nome”.

Esse termo é próprio do Evangelho joanino e mais profundo do que o “crer” nos três Evangelhos sinópticos (Mateus, Marcos e Lucas). Nesses, a fé sempre está relacionada a algum feito, a uma cura, a uma revelação de poder ou a determinadas palavras de Jesus.

No Evangelho de João e nas suas cartas, o objeto da fé sempre é a pessoa de Jesus. Na intimidade, a confiança demonstrada ao recebermos a pessoa de Jesus, leva-nos a um relacionamento de confiança filial, ingênua, com o Deus Pai.

(13) “... os quais não nasceram do sangue, nem da vontade da carne, nem da vontade do homem, mas de Deus”. A fonte ou a origem da filiação Divina não depende da ação nem do homem nem da mulher; ela é contrária a qualquer esfera humana. Onde lemos “carne” o original diz: “fluxo sanguíneo” (sangue), o que identifica a parte feminina. Com essa exclusão genérica da espécie humana, mais uma vez fica evidente que a filiação Divina é dádiva Divina e não resultado de esforço humano.

Em primeiro plano João nega o pensamento e ensino rabínico judaicas, que condicionam propriedade Divina à filiação israelita, à sucessão hereditária, à genealogia judaica. João abole, de uma vez por todas, essa “teologia do sangue” (cit.Schlatter).

Uma leitura antiga da Igreja primitiva, posteriormente não aceita como autentica, diz: “ ... o que não nasceu” (no masculino, singular) ao invés de “... os quais não nasceram...” (plural, geral). A primeira versão fora usada para argumentar em favor do nascimento virginal de Cristo, uma vez que o masculino singular obviamente se referia a Cristo. Apesar de ignorar “o sangue” (mulher) - que era uma parte no nascimento de Jesus - João nada sabe de um nascimento virginal. Simplesmente não lhe interessa.

“O verbo se fez carne... e a todos quantos O receberam, deu-lhes o poder de serem feitos filhos de Deus...”: essa é a proclamação solene do Prólogo.

Você já pensou a respeito de sua identificação “cristã”? Você é filho de Deus ou adepto de uma religião?
Lembre-se do “...a todos quantos” de João! Convide e receba-O!


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